A secreção vaginal normal é composta de substâncias semelhantes às do soro sanguíneo. Feita de água, albumina (uma proteína abundante no corpo) e de células brancas do sangue, além de mucina, a secreção normal é translúcida e sem impurezas. Não é subproduto de excreção tóxica, como a urina ou as fezes. As cores dos corrimentos que fogem desse padrão e indicam a presença de infecção variam entre o amarelado, esverdeado, marrom, roxo e até o preto tipo borra de café (ver tabela).
O termômetro da saúde vaginal é o índice de PH, ou potencial hidrigeniontico (ver PH Vaginal). O PH mede o grau de acidez ou alcalinidade de uma substância.A água, por exemplo, uma substância reconhecidamente neutra, tem índice 7 de PH. O PH da vagina saudável é mais ácido do que, por exemplo, o PH do café preto, que é 5. Ele varia de 3,8 a 4,5. Trata-se de um nível de acidez semelhante ao de um bom vinho tinto, observa a escritora Natalie Angier, ao comentar, entusiasmada: "Esta é a vagina que canta, é a vagina com buquê, com pernas."
CORRIMENTOS CRÔNICOS
De acordo com Iara Linhares, especialista em vaginose do serviço de ginecologia do Hospital das Clínicas de São Paulo e pesquisadora da Universidade de Cornell, em Nova York (EUA), os preservativos costumam estar na origem de grande parte dos casos de corrimentos crônicos. O látex das camisinhas pode provocar uma reação alérgica na vagina e desequilibrar o seu pH. O uso de produtos de higiene íntima (duchas vaginais) são outro agente irritante importante. As duchas vaginais destroem a flora benéfica de lactobacilos de Doderlein, que protegem a vagina de bactérias invasivas.
O uso de cremes vaginais sem acompanhamento médico é o outro fator potencial de corrimentos recorrentes. A maioria dos produtos usa o propileno glicol como "veículo" para incorporar o medicamento e muitas mulheres desenvolvem alergia a esta substância química. Se elas estão em tratamento médico, o ginecologista pode observar a reação, observa Iara Linhares. Existe até um medidor químico para isso, o teste Caugranulin B, que o médico deve usar para confirmar a alergia e corrigir o tratamento. "Mas é muito comum ver mulheres utilizando o mesmo creme que seu ginecologista receitou da última vez", diz a médica. "E aí se instala um círculo vicioso."
A atividade sexual com múltiplos parceiros, sem o uso de preservativo, é fator de risco de infecção vaginal, especificamente de vaginose, a infecção que produz o odor que lembra o cheiro de peixe. O corrimento de odor fétido aparece em geral quando a mulher mantém relação sexual, lembra Linhares. Sabe-se que o PH demasiado alcalino do sêmen, equivalente a 8, eleva o PH vaginal por várias horas depois de uma relação sexual, dando chance à outras bactérias que compõem a flora da vagina de proliferar. Quando o sêmen é familiar, a flora vaginal acaba se adaptando `a tal alteração momentânea de PH. Mas uma mulher que não tem um parceiro fixo e não usa preservativo fica exposta a sêmen de tipos variados e corre mais risco de ter a vagina permanentemente alcalina. Pesquisadores investigam ainda as causas de infecções vaginais por problemas imunológicos como a deficiência auto-imune, que sujeita a mulher a tornar-se hospedeira de agentes infecciosos, acrescenta Iara Linhares. "Estamos tentando saber, em última instância, como a genética interfere no sistema de defesa imunológico das mulheres".
São seis os tipos de infecções vaginais que produzem corrimento. A vaginose, a candidíase e a tricomoníase, cujo produto infeccioso é o corrimento visível, que a mulher percebe, e a clamídia, o mioplasma e a neisseria, ou gonorréia, que produz corrimento junto ao cérvix, a entrada do útero, não perceptível pela mulher. A redução do nível de lactobacilos na vagina e a conseqüente alteração do PH vaginal está na origem de todas elas. Entre os fatores que desequilibram o PH, além dos já mencionados, também são considerados o tratamento com antibióticos, que ao mesmo tempo que mata as bactérias invasoras pode diminuir a quantidade de lactobacilos na flora. Situações de estresse e de baixa da resistência do organismo, dependendo do impacto, causam o mesmo efeito e podem produzir infecções. "Algumas mulheres nascem com uma infeliz predisposição a ter desequilíbrios da flora vaginal, assim como certas mulheres são mais predispostas `a acne", lembra a norte-americana Natalie Angier, autora do livro Mulher, Uma Geografia Íntima (Editora Rocco).
COMO EVITAR
A visita regular ao ginecologista, uma vez por ano no mínimo, é a melhor forma de prevenção do corrimento. O médico tem condições de observar alterações no PH e meios de diagnosticar o agente infeccioso, muitas vezes no próprio consultório, esclarece a ginecologista Iara Linhares. Não faltam ferramentas para isso, como o teste que mede o PH, uma fitinha impregnada com reagentes químicos, ou o teste de Whiff para vaginose, que mistura uma gota de amostra do corrimento em uma solução de hidróxido de potássio, um meio alcalino e detecta o cheio característico da infecção. O exame da secreção em laboratório e a consulta propriamente, que levanta a história da paciente, são outros recursos que os médicos utilizam para definir o melhor tratamento de uma infecção instalada.
Manter uma alimentação saudável e cultivar bons hábitos de vida como a prática de exercícios físicos e até de algum tipo de meditação ou relaxamento também é recomendado para impedir que o corrimento volte. Evitar alimentos apimentados ou muito condimentados, álcool e cigarro em excesso e produtos enlatados ou industrializados, que contém conservantes químicos faz parte do tratamento. Além de observar a reação alérgica a determinas alimentos como o leite e seus derivados. "Tenho visto com freqüência mulheres com corrimento provocado por alergia `a proteína do leite”, diz Iara Linhares.
PREVENÇÃO ANTES DE ENGRAVIDAR
Toda mulher que planeja engravidar deve fazer exames para rastreamento de infecções vaginais e tratá-las. Elas representam risco de aborto, de parto prematuro ou mesmo de desenvolvimento de uma infecção séria após o parto e, em estágio avançado, podem levar a esterilidade. A infecção vaginal também tem grande potencial de acarretar problemas de formação no feto.
A ginecologista Iara Linhares adverte para as conseqüências graves da vaginose, uma das infecções mais comuns. A vaginose bacteriana se caracteriza pela proliferação na flora vaginal de bactérias anaeróbicas - que se desenvolvem na ausência do oxigênio. São verdadeiros micróbios que produzem compostos químicos pútridos como a trimetilamina - responsável pelo odor de peixe estragado. Em estado avançado, a infecção chega a destruir completamente a população de lactobacilos da vagina. E sem tratamento pode se transformar em outras doenças como endometrite (infecção do endométrio), doença inflamatória pélvica, salpingite (infecção das trompas), além de aumentar a predisposição para o desenvolvimento de câncer genital e dar origem à dor pélvica crônica, outras das principais queixas das mulheres que freqüentam os consultórios dos ginecologistas.
OS SINTOMAS DAS INFECÇÕES MAIS COMUNS
DIAGNÓSTICO | NORMAL | VAGINOSE | TRICHOMONAS | CANDIDA | |||
PH VAGINAL
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3.8 - 4.2 *
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Mais de 4.5 (alcalino)
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Mais de 4.5 (alcalino)
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Menos de 4.5 (ácido)
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APARÊNCIA DOS CORRIMENTOS
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branca, transparente
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branca, transparente, leite, cinza
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amarelo,verde, espumado
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branca, coalhada
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ODOR
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ausente
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peixe
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peixe
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ausente
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* Um dos componentes da flora vaginal são os bacilos de Doderlein, responsáveis pela transformação do glicogênio em ácido lático que mantém a acidez vaginal em torno de 3,8 e 4,2, não permitindo o desenvolvimento de microorganismos patogênicos.
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